O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA: PRÁTICAS CORRENTES E MUDANÇAS POSSÍVEIS

               Ida Maria M. Marins (Universidade Federal do Pampa/Jaguarão)

 

 

Introdução

 

Há tempos discute-se sobre as necessidades de melhorar a qualidade da educação no país. O ensino de Língua Portuguesa, em particular a questão da leitura e da escrita, vem permeando o eixo da discussão em torno dos baixos resultados obtidos a partir das avaliações realizadas pelo governo federal em escolas de todo o país. Este fato parece estar relacionado a diferentes fatores, entre eles: as dificuldades que as escolas têm em discutir, no âmbito da própria escola, planejamentos, projetos que se voltem ao ensino da leitura e escrita a partir da realidade das comunidades com quem trabalham; a falta de orientação e compreensão pelos educadores da relevância no investimento de práticas da leitura/escrita; além de entender que a falta de formação em serviço dos profissionais que lidam com o ensino da língua, muitas vezes torna-se um dos maiores impedimentos na promoção de práticas mais qualificadas. Todos esses fatores, por certo, acabam contribuindo para os resultados preocupantes que o governo vem apontando em suas pesquisas, contudo, eles não estão isolados – são reflexo de uma conjuntura social, política, educacional que o  país  determina, fazendo perpetuar práticas legitimadas em nossa sociedade.

Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa (1998), essas dificuldades e ausências se expressam com clareza nos dois gargalos em que se concentram a maior parte da repetência: no fim da primeira série (ou mesmo das duas primeiras) e na quinta série. No primeiro, pela complexidade do ato de alfabetizar; no segundo, pelo fato de a escola não conseguir garantir um trabalho eficaz com o uso da linguagem, condição para que os alunos possam continuar a progredir até o fim da oitava/nona série. Assim, considerando os fatores acima explicitados; o interesse e necessidade de interagir com uma realidade educacional local para mim desconhecida, propus em 2008, com a colaboração de alunas bolsistas[1], um projeto de pesquisa denominado “O ensino da Língua Portuguesa no nível fundamental das escolas públicas de Jaguarão: reflexões, ensaios e possibilidades de mudanças”; que teve por objetivo investigar a realidade do ensino da língua materna nas escolas da rede pública da cidade de Jaguarão/RS para propor, a partir dos dados coletados e analisados, o desenvolvimento de ações, via projetos de extensão, que possam provocar a reflexão e o exercício de pensar práticas inovadoras para o ensino da língua. Para essa investigação foram selecionadas três escolas públicas municipais de diferentes bairros da cidade, de onde foram recolhidos alguns documentos para análise: Projeto Político Pedagógico (PPP), programas de ensino da Língua Portuguesa nas séries finais do fundamental, num primeiro momento, e, em seguida, foram aplicados questionários: um destinado aos professores de língua e um outro aos alunos de 5ª a 8ª séries. Também foi realizada uma entrevista com as professoras após terem respondido ao questionário.

Esses dados, bem como os resultados obtidos na pesquisa, serão apresentados no decorrer do texto. Para a sua discussão servirão de referencial teórico os PCNs de Língua Portuguesa (1998), trabalhos na área da educação e de ensino de língua materna, os quais  servirão para subsidiar o estudo feito.

 

 

O percurso realizado

 

            Conhecer a realidade do ensino de Língua Portuguesa nas escolas públicas da cidade de Jaguarão/RS no nível fundamental tornou-se uma necessidade a partir de minha inserção como professora do curso de Letras na universidade local - um dos motivos para o desenvolvimento desse projeto de pesquisa. Para tanto, foi necessário conhecer a proposta de ensino das escolas por meio do PPP e dos conteúdos programáticos para o trabalho com a língua materna, assim como, promover diálogos com professores através de entrevistas semi-estruturadas e o preenchimento de questionários pelos educadores e alunos - instrumentos fundamentais para que pudéssemos diagnosticar as práticas de ensino de língua nas escolas públicas da cidade e propor, depois, o desenvolvimento de ações que possam instigar a reflexão e o exercício de pensar práticas inovadoras para o ensino da língua. Para tanto, percebemos aqui a importância de situar as condições histórico-sociais/educacionais do local para melhor compreender as práticas de ensino/aprendizagem correntes, pois partimos da crença de que estas constituem os contextos e são constituídas por ele no curso da atividade humana. Nesse sentido, contribui Sobral (2009) ao referir-se que toda atividade produtiva acontece no âmbito das relações dialógicas entre sujeitos inseridos em contextos sociais e históricos.

 

O contexto local

 

            Jaguarão é uma cidade do interior do Rio Grande do Sul, fazendo fronteira com a cidade uruguaia de Rio Branco, intercambiadas pela Ponte Internacional de Mauá. Seu patrimônio arquitetônico é belíssimo, com lindas construções do século passado que permanecem muito bem conservadas. A população é hoje estimada em torno de 28.000 habitantes, e a base da economia gira por conta do comércio e da produção arrozeira. Na área da cultura tem-se presenciado alguns movimentos nesses últimos dois anos, indicando um investimento de oferta à população, de acesso aos bens culturais, como a instalação de uma sala de cinema que por muitos anos já não mais existia; a criação de uma feira do livro com apresentações de escritores da região; atividades artístico-culturais diversas: shows, seminários, colóquios, retomando e divulgando a riqueza do patrimônio cultural com seus artistas plásticos, escritores, compositores e cantores da cidade.  Na educação, os movimentos ainda são um tanto módicos; a secretaria da educação e as escolas estão vivendo um processo de discussão para a elaboração de propostas, via constituinte escolar, que venham atender aos problemas vividos pela educação básica na cidade. Em relação aos professores de língua portuguesa, percebemos que a grande maioria não tem formação em Letras, suas formações são as mais variadas: licenciados em história, geografia, educação artística, pedagogia séries inicias, que atuam com o ensino da língua para complementarem a sua carga horária de trabalho semanal.  Isto foi para mim impactante, pois não imaginava encontrar um cenário dessa ordem, haja vista a quantidade de programas implementados pelo governo federal nos últimos anos, os quais favorecem a formação continuada dos profissionais em serviço; segunda licenciatura, por exemplo. No entanto, é humanamente compreensível a realidade posta, pois a quantidade de escolas públicas na cidade não comporta um número maior de profissionais e estes precisam assegurar a sua estabilidade no serviço público, atendendo as diferentes demandas educacionais locais.   Eis aqui um exemplo claro da chamada proletarização da profissão professor. Segundo Enguita (1991, p. 41, apud Brzezinski, 2002, p. 114), o termo proletarização docente é usado para definir um conceito oposto ao de profissionalização. O primeiro está relacionado à desvalorização da ação docente, ou seja, uma atividade que requer uma disposição do professor para atuar em diferentes frentes, desconsiderando a necessária competência de cada área do conhecimento conferida pela formação específica em nível universitário. Trata-se, segundo Brzezinski (2002) de “uma atividade prática, simplista e prescritiva, baseada no saber fazer...” (p. 15). A profissionalização docente, por sua vez, exige o desenvolvimento de saberes que são: os específicos das áreas do conhecimento; saberes pedagógicos e das experiências acumuladas dentro e fora da sala de aula. O conjunto desses fatores, no meu entender, irão favorecer uma postura reflexiva do professor sobre o seu fazer; um dos aspectos fundamentais para a realização de práticas competentes e provocadoras de potenciais de transformação da realidade educacional-social da sociedade.

 

Discussões

           

            Na análise dos documentos acima citados nos detemos, especificamente, nas concepções de educação, nos objetivos gerais do projeto pedagógico, nas práticas dos professores subjacentes aos conteúdos programáticos, na percepção dos alunos em torno do ensino da língua como também na compreensão da necessidade de formação continuada pelos professores entrevistados. Das análises feitas foi possível evidenciar uma preocupação, que é traduzida nos PPPs e confirmada nas entrevistas com as professoras, em discutir e realizar práticas pedagógicas que promovam uma ruptura com os paradigmas tradicionais de ensino, através da elaboração de projetos, atividades diversificadas, troca de experiências que possam atender a realidade das comunidades em que estão inseridas, numa perspectiva emancipatória de educação que compreenda a necessidade de formar um aluno crítico/participativo na sociedade. Nesse sentido, contribui Santiago (2001) ao afirmar que são as discussões em torno de uma mudança paradigmática que centralizam as preocupações dos educadores em busca de uma reestruturação curricular demandada pelas exigências do próprio projeto em construção e pelas atuais políticas educacionais. Da mesma forma, essa postura representada pela escola e professores parece estar articulada aos pressupostos lançados nos PCNs que anunciam o compromisso social da escola no seu papel de formar alunos que sejam capazes de “posicionar-se de maneira crítica, responsável e construtiva nas diferentes situações sociais utilizando o diálogo como forma de mediar conflitos e de tomar decisões coletivas” (PCNS, 1998, p.5).

            No entanto, apesar de explicitarem a necessidade de pensar propostas mais ousadas na elaboração de seu currículo, observa-se, pelos conteúdos programáticos, uma inconsistência entre o proposto no PPP e aquilo que efetivamente parece acontecer na sala de aula em relação ao ensino da língua materna: conteúdos que sinalizam o modelo tradicional de ensino com ênfase na gramática. Também paira um sentimento de insegurança das professoras entrevistadas ao falarem de práticas inovadoras, o que é traduzido pelo desconhecimento que têm das propostas apresentadas nos PCNs. Aqui vale destacar que as mudanças almejadas pelas políticas governamentais desde 1998 não foram acompanhadas de medidas concretas para garantir melhorias no ensino. Segundo ROJO (2001) existe uma ausência e a necessidade de elaboração de textos de divulgação científica que orientem os professores nesse processo de reflexão sobre o ensino, implicando uma rediscussão das práticas tradicionais de ensino da gramática.

            Vale destacar que os textos científicos circulantes no meio educacional: diretrizes, propostas metodológicas, entre outros, têm representado um problema aos profissionais segundo pesquisas realizadas. Prudêncio (2004), sinaliza, em estudo feito sobre propostas curriculares para o estado de Santa Catarina e os planos de disciplina para o ensino médio no mesmo estado, que:

  [...]   o imaginário que constitui o sujeito-leitor para os autores de propostas curriculares é aquele sujeito-leitor membro da comunidade científica. Contudo, o leitor-real desses textos é aquele professor que não faz parte da comunidade científica, pois enquanto interpelado pelo DP (discurso pedagógico) está alheio ao processo de  produção [...] é incapaz de desencadear  o processo de significação do referido texto (p.3)

 

 

            A ausência e necessidade de medidas concretas em favor da qualidade do ensino de língua passa, obviamente, pela implantação de políticas de formação continuada, conjugadas às responsabilidades das instituições educacionais. Esta questão se materializa nas falas das professoras entrevistadas, como podemos acompanhar.

Em uma das escolas as professoras ressaltam que em anos anteriores a Secretaria Municipal da Educação chamou os professores para discutirem questões relativas ao ensino de língua portuguesa, mas no ano corrente (2009) esta prática ainda não se efetivou. Na outra escola as professoras fazem referência ao investimento pelo setor público local em ações voltadas à educação infantil, deixando, portanto, as séries finais do fundamental um tanto à parte do processo de qualificação do ensino.

            Devido a essa falta de políticas em torno do ensino da língua materna (LM), as professoras acabam planejando seus trabalhos com base em métodos que julgam ser mais eficazes e isto se reflete nas práticas que, tanto são individuais como atestam algumas professoras, ou  coletivas na tentativa de desenvolver projetos de ensino que, no dizer das professoras, seriam “atividades interdisciplinares”.  Assim, em uma das escolas as professoras preferem trabalhar individualmente, já em outra, optam por trabalhar em grupos, reunindo-se para elaboração de atividades “interdisciplinares”, através de projetos de ensino.

            Na sequência das entrevistas, as professoras ao serem questionadas sobre o conhecimento dos PCNs para o ensino da LM e sobre os recursos que utilizam para desenvolver seu trabalho em sala de aula, como por exemplo o livro didático; vê-se que há um desconhecimento do texto dos PCNs e quando há ele não traduz a real compreensão deste documento, o que corrobora com a afirmação de Prudêncio citada acima.  Assim pode-se considerar que, conforme ROJO, a não circulação desses referenciais e o indevido trato a eles dado é uma questão a ser levantada para discussões entre os profissionais do ensino, nas instituições universitárias e escolares. Em relação aos recursos pedagógicos, compreende-se que o livro didático (LD) não faz parte dos instrumentos rotineiros utilizados no trabalho das professoras, pois ao questionar o acesso a este material para o trabalho as professoras dizem ter acesso, mas acreditam que ele não dá mais conta de suprir as necessidades exigidas pelos alunos, pois os professores entendem que o LD é um recurso hoje “ultrapassado”, tornando-se para os alunos apenas um peso a mais na mochila. Por conta deste entendimento uma das escolas resolveu investir na compra de outros recursos materiais: jogos lúdicos, um data-show, com intuito de melhorar o ensino de língua portuguesa. Já em outra escola, as professoras alegam que para trabalhar com texto o livro didático é um bom auxiliar, mas para o ensino de gramática já nem tanto, pois acreditam que os alunos encontram dificuldades para realizar as atividades propostas neste material.

            Em relação aos questionários respondidos pelos alunos, confirmou-se que há, realmente,  uma quase ausência do recurso – livro didático em sala de aula, uma vez que grande parte desses educandos menciona que nas aulas de língua portuguesa o recurso mais utilizado é o caderno de aula e o livro didático aparece em segundo plano. Quanto a outros materiais, como revistas, jornais, pôde-se constatar uma grande ausência na utilização desses recursos. Porém, mesmo com essa carência de materiais em sala de aula, a maioria dos alunos envolvidos na pesquisa afirma gostar das aulas de Português. Em uma das escolas, a maioria justifica esse gosto pelo fato de achar as aulas interessantes; em outra escola, grande parte dos alunos dizem gostar das aulas porque, além de interessante, é uma matéria boa para aprender gramática. Esses dizeres podem ser justificados nas respostas dadas a partir do questionamento feito em torno dos seus interesses em trabalhar com a língua. Reunindo as informações das três escolas obtivemos dos alunos por ordem de preferência: ouvir o professor explicar a matéria; conversar com professor e colegas sobre diferentes assuntos; escrever histórias e outros textos; e por último – ler livros, jornais, revistas.. Percebe-se, então, que os alunos muito pouco vivenciam outras práticas de ensino da língua que não a de estudar a gramática ensinada pela professora – ouvir o professor explicar a matéria. Esta é a referência que eles têm, por isso a sua expressão e entendimento que aprender língua portuguesa significa aprender gramática/matéria. Fica também evidenciado que práticas de leitura e escrita de diferentes gêneros textuais não são realizadas, pois os alunos colocam como últimas alternativas e com baixíssimo índice quantitativo o interesse em participar dessas práticas; possivelmente por não vivenciá-las na sua rotina escolar.

Com essas informações podemos perceber a importância e urgência de se pensar caminhos que possam convergir para um ensino de língua inovador, pensado a partir dos referenciais dos PCNs, de outros pressupostos teórico-pedagógicos e também de algumas boas propostas que alguns livros didáticos têm apresentado, sem, obviamente, perder de vista o desejo e interesse que os professores devem ter por inovar, por buscar novos conhecimentos para tornar suas aulas de língua materna mais atrativas, significativas. Torna-se também fundamental que o professor esteja atento às necessidades dos seus alunos, levando em conta, por exemplo, o desenvolvimento cognitivo de cada um, bem como os interesses particulares de cada grupo de alunos, como aponta SANTIAGO (2001).                                                                                                                                                                                                      

             O interesse em inovar ficou explicitado nas respostas das professoras que sentem a necessidade e desejam participar de formação continuada, seja ela através de uma especialização, ou cursos seqüenciais; mas o maior apelo feito é que a Secretaria Municipal de Educação realize eventos direcionados a área de língua portuguesa. Com base em todas as informações coletadas  ao longo da pesquisa e aqui apresentadas pudemos  partir para o desenvolvimento de ideias convergentes ao propósito final deste trabalho; o de pensar propostas de formação continuada aos professores da rede municipal.

            Considerando, então, a manifestação dos professores por formação em serviço, a percepção da necessidade de pôr em discussão as orientações de que tratam os PCNs, principalmente no tocante às propostas para o ensino da língua articuladas às novas concepções de linguagem; elaboramos em 2010 um projeto piloto de extensão, intitulado: Português na sala de aula: mudanças possíveis, que teve por objetivo atender aos interesses e necessidades de formação continuada dos professores de língua portuguesa, visando a socialização das práticas realizadas, discutindo-as e pensando modos outros, possíveis e inovadores para o ensino/aprendizagem da língua na escola. Esse projeto contou com a parceria da secretaria municipal da educação da cidade e com a colaboração de colegas da universidade. Assim, apresentamos uma proposta que entendíamos atender naquele momento as demandas dos professores, oferecendo oficinas cujas temáticas versaram sobre: PCNs para o ensino da língua portuguesa com enfoque nos gêneros textuais: aspectos teóricos e práticos; ensino da gramática numa perspectiva sócio-discursiva; experiências de leitura – formação do leitor.  A adesão dos professores foi relativamente pequena e as avaliações feitas pelo grupo participante foram significativas para compreender melhor o processo de diálogo universidade – escola. Apesar de a   pesquisa ter apontado o forte interesse por formação continuada, os professores, no momento de integrarem-se às práticas de formação apresentam resistência; o que já era esperado, pois um estigma muito forte permeia as relações entre academia e escola. Este estigma tem origem na história das pesquisas realizadas pela academia que, em muitos poucos casos, contribui efetivamente para o trabalho dos professores nas escolas. Também, como afirma Prudêncio (op. cit), a linguagem acadêmica contribui sobremaneira para o ceticismo dos professores em relação ao que lhes é oferecido. Nessa direção contribui Furlanetto (2008):

Os professores consideram, não sem razão, que os acadêmicos não têm sensibilidade para a complexidade do que eles vivenciam no seu espaço de trabalho, quando não se sentem também explorados e magoados com o perfil negativo que deles é feito – daí a resistência. Há o sentimento de marginalização, e mesmo de exclusão, o que contribui para recrudescer a sensação de que a teoria não tem muito a ver com a prática (p. 303).                                                       

 

Considerações

 

            Neste trabalho foram abordadas questões referentes ao ensino da Língua Portuguesa nas escolas públicas municipais, no nível fundamental da cidade de Jaguarão, com o intuito de investigar a realidade para poder propor ações articuladas entre secretaria da educação e universidade por entender o compromisso que essas instituições têm em qualificar o ensino/aprendizagem; no caso específico o ensino da língua materna.  Assim, entende-se que o objetivo inicial da pesquisa fora alcançado, considerando os procedimentos feitos e os resultados obtidos. A realidade apresentada aponta questões cruciais para serem refletidas: as práticas de ensino da língua ainda são as bases do ensino tradicional numa concepção de linguagem estruturalista objetivada em ações diretivas – professor transmite um conhecimento já estabelecido e consagrado como o “certo”. A gramática tem seu lugar de destaque e os alunos entendem que aprender língua é ouvir o professor ensinar a “matéria”. Segundo pesquisas na área (ROJO, 2001; TARDELLI, 2002; ANTUNES, 2003; entre outros) a permanência do ensino voltado a uma concepção de língua enquanto sistema  justifica-se pela legitimidade que esta tem enquanto saber “científico”. Portanto, aprender a língua como mecanismo de apreensão de um saber que irá capacitá-los ao uso “correto” da língua significa qualificar os indivíduos para a obtenção de passaportes sociais, e a escola entende  que para ascender socialmente é necessário dominar a língua dita padrão apresentada pela gramática prescritiva.

            Também ficou bem marcada a resistência dos professores de participação na formação oferecida pela academia. Este foi um movimento inicial que a universidade, juntamente com a secretaria e escolas, vem procurando fazer, mas sabemos que não será fácil, pois as tensões e os medos  às mudanças estão presentes. Mudanças que sugerem desafios, desacomodações que contrapõem em certa medida as crenças e valores desenvolvidos ao longo de uma tradição. Entendemos que é preciso promover uma política de integração universidade/escola como um mecanismo que possa desenvolver ações intercambiáveis significativas para os dois espaços de formação, permitindo o diálogo aberto, o respeito mútuo e principalmente desenvolver o sentimento de partilha de saberes entre essas instituições.

 

 

Referências bibliográficas

 

ANTUNES, I. Aula de português: encontro e interação. São Paulo: Parábola Editorial, 2003.

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto: Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa, 1998.

BRZEZINSKI, Iria. Profissão professor: identidade e profissionalização docente. Brasília: Plano Editora, 2002.

ENGUITA, M.H. A ambigüidade da docência entre o profissionalismo e a proletarização. 1991. In:  BRZEZINSKI, Iria. Profissão professor: identidade e profissionalização docente. Brasília: Plano Editora, 2002.

FURLANETTO, M.M. Inovações e conflitos na proposta curricular de SC: perspectivas na formação de professores. In: Linguagem e Ensino: Revista do Programa de Pós-graduação em Letras – UCPel. Pelotas: Educat, v. 11 n.2 julho/dezembro, 2008.

PRUDÊNCIO, P. Proposta Curricular de Santa Catarina: um lugar de confronte entre o discurso pedagógico e o discurso científico. Dissertação de Mestrado -  Programa de Pós-Graduação em Ciências da Linguagem. Universidade do Sul de Santa Catarina, Tubarão, 2004. Disponível em <http:// www.unisul.br/paginas/ensino/pos/linguagem/base.htm>

 ROJO, R. (org) A prática de linguagem em sala de aula: praticando os PCNs. Campinas: Mercado Aberto, 2001.

 SANTIAGO, Maria Eliete. Projeto pedagógico da escola: uma contribuição ao planejamento escolar. In: Revista de Administração Educacional, Recife, v. 1, n° 1, p. 69-73, jul./dez. 1991.

SOBRAL,Adail. Do dialogismo ao gênero: as bases do pensamento do círculo de Bakhtin. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2009.

TARDELLI, M.C. O ensino da língua materna: interações em sala de aula. São Paulo Cortez, 2002.

           



[1] Destaco o precioso trabalho das alunas: Richieli de Brito (bolsista PBDA); Josséle Vieira e Carolini Gonçalves (bolsistas voluntárias), que muito contribuíram para a realização do presente estudo.